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quarta-feira, 6 de abril de 2016

Carnival Glass e a Matemática

No final do mês passado, eu recebi um e-mail de um amigo, Derek Sumpter, que vive em Hampshire, Reino Unido.

No e-mail ele e sua esposa Carol Sumpter suspeitavam de possíveis conexões entre peças produzidas na Alemanha no início do século passado com peças produzidas no Brasil.

Assunto muito intrigante!

Além dessas possíveis conexões, que provavelmente aconteceram, o que me chamou muito a atenção foi a matemática envolvida nessas peças.

E é isso que eu quero mostrar na publicação de hoje.

Mas antes, meus sinceros agradecimentos a Derek e Carol, por me passarem informações tão precisas e por permitirem publicá-las aqui no blog  juntamente com as fotos dos pratos Blucher e ROM.
E também ao meu amigo Álvaro Aguiar por me enviar fotos de manteigueiras carnival glass tão lindas onde uma delas está sendo utilizada aqui na publicação.

A primeira peça é um prato, conhecido por ROM, produzido pela Brockwitz e que aparece no catálogo dessa empresa de 1915.

Quem conhece carnival glass brasileiro deve ter notado uma pequena semelhança com uma peça muito conhecida no Brasil.
Fácil fazer a conexão?

Acertou quem falou Olho da Rainha.


A estrela no círculo central do ROM lembra a estrela do Olho da Rainha.
A primeira opinião que eu tive, é uma explicação matemática.
Uma estrela de 6 pontas inscrita em uma circunferência é a maneira mais fácil de dividir, em partes iguais essa circunferência.

Trezentos e sessenta graus da circunferência dividido por seis resulta em 60° , ou seja, um hexágono inscrito na circunferência.

Mas, reparando bem, existe um detalhe que faz acreditar não ser apenas uma coincidência mas sim uma inspiração para a Guarany (?) iniciar o Olho da Rainha pelo desenho da estrela.
Esses riscos que saem da junção de duas pontas, são iguais no ROM e no Olho da Rainha. Não podem ser simples coincidências.

O próximo prato, Blucher foi comparado com um prato da Esberard, o Mundo Bom.

Aqui o prato com padrão Blucher.

E o Mundo Bom da Esberard.



Derek Sumpter acredita que a empresa alemã VEB Sachenglass usou um molde de uma outra alemã August Walther que produziu esse padrão na região de Dresden entre os anos 1920 e 1930.
A VEB Sachenglass usou esses moldes nos anos 1950 e 1960, e como sabemos, a Esberard Rio encerra suas atividades em meados de 1940.

Muito semelhantes.

Será que algum imigrante vindo da Alemanha para o Brasil trouxe a ideia do Blucher para a Esberard?

Ou alguém da Esberard viu o Blucher em alguma feira ou convenção e tentou fazer algo parecido?

A matemática por trás dos pratos é que o Blucher é formado por um decágono (36°) inscrito na circunferência enquanto o Mundo Bom é formado por um hexadegágono (22° 30').



Geometricamente, é mais difícil construir um decágono do que um hexadecágono, porém visualmente, o Mundo Bom parece ser um prato mais charmoso do que o Blucher.

E daqui a pouco eu vou explicar o motivo pois antes, para encerrar os polígonos inscritos, uma manteigueira do meu amigo Álvaro.

De começo eu confundi a manteigueira da foto com uma manteigueira Blucher que aparece no catálogo da Walther de 1936.

Mas a matemática não nos deixa enganar.

Como foi falado, a Blucher é formada por um decágono e essa manteigueira por um dodecágono, portanto mais uma peça com possíveis conexões com a Alemanha.



Agora vamos para a explicação do porque uma peça pode ser mais charmosa, bonita do que outra.

Por curiosidade e suspeita eu peguei a medida do raio de três peças e dividi pela medida da parte raiada ( a distância da borda até o início do anel central).
O resultado me deixou muito animado.

Peça 1 - Prato Blucher
O resultado de 14,4 dividido por 9,6 é exatamente igual a 1,5.

Peça 2- Prato Rosarinho
Dividindo 11,2 por 6,5 obtemos, aproximadamente 1,7

Peça 3 - Prato Mundo Bom
E o resultado de 12,8 dividido por 7,9 é 1,6 ou com precisão centesimal 1,62!

O que este resultado significa?

Que a medida do raio do Mundo Bom em razão (divisão) com a do raiado tendem a chegar a um número conhecido como "razão de ouro", "razão áurea" ou ainda "número de ouro" que é um número irracional e aproximadamente igual a 1,61803.

É um número muito comum na natureza e em alguns fatos curiosos, apesar de existirem matemáticos e cientistas tentando provar que em muitas situações a razão áurea não aparece.

Algumas pessoas o denominam como "número da beleza", ou seja, consideram que quando a razão entre duas medidas de um objeto resulta em 1,6 significa que esse objeto é "belo aos olhos".

Dos três pratos, dois chegam próximo a 1,6, diferença de um décimo, e um chega mais precisamente a esse valor.

Claro, vale lembrar que erros na tomada das medidas podem ter ocorrido, por mais cuidado que eu e o Derek tenhamos tomado, portanto tanto o Blucher quanto o Rosarinho darão uma diferença na igualdade da proporção áurea (Não, não vou entrar nesse assunto aqui!)

Mas o que me intriga é, será que essas medidas são propositais?

Ou será que foram feitas ao acaso e os meus resultados não passam de simples coincidências?

É, é a beleza do carnival glass com a magia da matemática!

E para finalizar, apenas uma pequena explicação do nome Mundo Bom para essas peças da Esberard Rio.


Quando eu fui dar o nome para as peças, fiquei na dúvida entre vários nomes, mas Mundo Bom ganhou a minha simpatia por dois motivos.

Primeiro porque esses raiados me lembram a abertura da novela Êta Mundo Bom da Rede Globo de Televisão.
Os raiados me lembram o sol que aparece na logomarca da novela.

Segundo porque foi nessa mesma novela que eu vi uma peça carnival glass sendo usada pela primeira vez como peça de cenário.

A peça é um vaso brasileiro conhecido como Aztec Headdress (Cocar Azteca) e faz parte do cenário que é a casa dos personagens dos atores Tarcísio Filho e Débora Olivieri que aparece nessa cena:


Portanto, nada mais justo do que fazer uma homenagem e batizar o padrão de Mundo Bom!